Bem vindo a este espaço de troca e reflexão de ideias.

O QUE SENTIMOS PODE SER FALADO.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Greenbrae.

As cinco, Marine e' pessego. A America se parece mais com Obama do que com Bush. O sonho americano acontece com Obama. Porem, sem Bush nao existiria Obama.
As 12, como o verao e' quente, me lembra o Mexico. A California tambem tem essa heranca latina. Bush foi um verao arido e seco. Tolice fazer generalizacoes sobre qualquer povo. Estando na America, na casa de norte americanos, percebo que eles sao generosos, calorosos e amigos.

Eu tinha um registro da morte somente em tumulos, ou muito em epitafios. Mas caminhando pelo canal que acompanha Elizabeth Circle, li numa placa, fixada no encosto de um banco, a seguinte frase: Com amor em mem'oria de David e Sue, de seus filhos. Na casa em que fui recebido havia uma outra frase, e junto dela, uma foto de Obama, autografada por ele. Ela dizia: There is never been a better time - Obama Biden. Isto fazia parte de um documento entregue a dona da casa onde estamos hospedados. Ela havia trabalhado na eleicao de Obama. Aqui se confere visibilidada publica ao trabalho de uma pessoa que fez a diferenca. Isso 'e ser adulto.

Lembrar de alguem quando se esta diante de uma paisagem de tamanha beleza, e reconhecer a importancia de quem lhe deu vida, 'e uma homenagem que destitui a morte de sua aridez.

Eu nunca havia estado na casa em que me hospedei. Nao conhecia os donos. Eles haviam viajado, e uma amiga falou sobre minha familia para eles. Depois de 25 horas de voo, chegamos a casa. Um texto impresso nos orientava a respeito da rotina. Me senti estranho estando entrando em um lugar tao intimo abruptamente e sem ter qualquer relacao de afeto com os donos.

Percebo que confiar em nos. acreditando apenas nas palavras de quem nos apresentou, faz parte de uma logica de estar no mundo. Nesta sucessao de acontecimentos, me sinto parte de uma ciranda de respeito e amizade.

domingo, 12 de julho de 2009

Entre San Francisco e Berkeley.

Acabo de chegar em Sanfran. O Rio de Janeiro continua lindo, mas São Francisco também!
Muito aconteceu nestas ruas, nestes parques por onde passou Foucault e muitos Homeless, ex-hippies. Se continuarem a ler este blog poderão saber mais sobre esta cidade fascinante.

MULHERES DE PAPELÃO

Sócrates Nolasco

- O que é isto Quincas, se pendurando na morena?
- Eu tropecei Teo!
- Cara que compra grande! O que você tem aí neste sacolão?
- Nada não...
- Como nada? Você acabou de sair do Sexshop, se atraca com esta mulher de papelão e diz que não tem nada no pacote.
- Deixa disso Teo. Quem consegue andar por esta cidade e não esbarrar nas popozudas espalhadas pelas calçadas e todas em tamanho natural. Sem falar da quantidade de revistas de sexo penduradas nas bancas, é só bunda suspensa sobre histórias em quadrinhos.
- Quincas, outro dia fui pegar minhas filhas para passear e fiquei constrangido de vê-las andando por estas Sapucaís nas quais se transformaram as ruas desta cidade. Deu-me um frio na espinha quando percebi que isto pode influenciá-las a entender o que é ser uma mulher.

Acreditou-se que a beleza salvaria o mundo e as mulheres foram incumbidas de fazê-lo, quer seja como mães ou esposas. Nos dias de hoje, a beleza entendida como dom de Deus, bem como a melhor carta de recomendação foi relida pelo bisturi. Do belo extirparam o sublime, fazendo as mulheres acreditarem que um amor construído sobre a beleza não morrerá com ela. Hoje, ficou extremamente empobrecida a experiência necessária para que uma menina, tranqüilamente, cresça e descubra que ser uma mulher adulta não é ser de papelão.

Casanova dizia que a beleza é uma outra forma de verdade, contudo, sabemos que ele não se referia a coelhinhas, ao silicone nem a lipo. A beleza sempre foi uma promessa de felicidade, mas do que estamos falando se dela também extirparam o pudor?

A beleza quando não é sublime e não tem pudor transforma uma mulher num extraordinário monumento pneumático. O sublime e o pudor se associados à beleza conferem a mulher sabedoria e nada é mais gratificante do que amá-la por isto. A sabedoria retira da beleza a certeza de que ela é dispensável à vida, redirecionando sua exuberância para a virtude.

Muitos homens sabem que o que os atrai em uma mulher raramente os vincula a ela, a beleza que seduz poucas vezes coincide com a que faz apaixonar.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

VIAGaRA FALLS

Sócrates Nolasco.


Teo e Alex foram ao Maracanã assistir a um jogo e depois marcaram um encontro com amigos num bar.
- Teo, vamos lá, a galera já deve estar comemorando.
- Comemorando o que se o jogo deu empate?
- Não importa! Olha só como tem mulher bonita!
- Alex, se eu continuar seguindo seu ritmo acabo com torcicolo. Parece lobo na casa da vovó, passa uma mulher e você saliva.
- Teo vou até ali esvaziar o tanque.
- Ali onde?
- Naquela árvore.
- Como é que é? Você passou anos no Santo Inácio pedindo para ir ao banheiro para acabar urinando numa árvore no meio da rua?
- Cala a boca que eu perco a concentração! Minha mãe me apresentou as árvores muito antes do colégio me apresentar o banheiro. Vamos lá, vamos ver quem consegue fazer mais longe!
-Alex presta atenção! Você está com os pés dentro de uma poça de mijo, deve ser de algum torcedor que veio demarcar território. Eu não participo desta molecagem.
- Teo vamos chegar naquelas mulheres ali.
- Não tô afim não, tô cansado, quero ir pra casa.
- Deixa disso brother, eu tenho Viagra suficiente pra deixar qualquer torcedor desempregado rindo a toa.
- Você tá tomando isto?
- Qual o problema? As mulheres gostam e eu não falho!
- Cara você tem 35 anos!
- Teo tô te estranhando. Depois da separação tu deixou a gandaia, não azara mais como antes, quer ir pra casa cedo...
Ô cara tu tá mudando de time?
- Alex, quando você diz estas coisas eu acho que seu bíceps assumiu o controle do seu córtex. Primeiro você acha que tomando viagra aumentará seu pênis, depois acredita que o mantendo sempre ereto se sentirá poderoso como uma hidroelétrica; além do que, você vive sacaneando todo mundo com esta inteligência de torcedor fanático.

Na infância muitos homens se sentiram diminuídos por não desejarem o que caberia a um homem, mas muitos se superestimaram pelo contrário. Para escapar da humilhação, buscam vencer todo desafio se tornando os primeiros em tudo.

O mundo dos homens funciona na lógica perdedor-vencedor. Nele, acredita-se que seja possível viver sem perder. Todavia, a perda modela e define, amadurece.

Em nome de uma biologia ficcional acredita-se que sejam os genes os determinantes da aptidão dos homens para o futebol e para treparem como bonobos. A fé em uma virilidade pura corporificada pela força física faz com que muitos homens se identifiquem com rambos exterminadores e dependam de um guindaste farmacológico para manterem a ereção.
Concebida desta forma, a força masculina ficou restrita a força bruta, que se não conduzida pela razão, desmorona sobre o próprio peso e em queda-livre, se a inteligência estiver desprovida de afeto.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Shavuot 5769

Sócrates Nolasco.

Considerações sobre o 2o. MANDAMENTO.


Êxodo 20:3 - Não terá outros deuses diante de mim.
Êxodo 20:4 - Não fará para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.
Êxodo 20:5 - Não as adorará, nem lhes dará culto; porque eu sou o senhor, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem.
Êxodo 20:6 - Faço misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus mandamentos.

Uma direção para a fé (Emuna).


A luta de Jacó com D-us em Penuel (Gn 32, 23-33), pode ser interpretada como sendo o encontro entre dois grupos: o de Jacó (Israel) e o de Josué.

Em Peni-El estes dois grupos se depararam pela primeira vez, e declaram fidelidade a Yahveh (Jos 24, 14-15). No monte Ebal, havia um santuário frequentado por cananeus e israelitas conjuntamente. Josué obrigou o povo a eleger entre os deuses cananeus e amoreus aquele que os tiraria do Egito.

A partir de Josué pode-se considerar Yahveh o D-us de Israel, celebrado no canto de Débora.

A religião judaica passou da monolatria para o monoteísmo. Chegou-se ao monoteísmo através dos deuses tradicionais, bem como de um longo processo de maturação religiosa. Por esta razão, o primeiro mandamento reafirma isto (Ex. 20, 2-4 e Dt 5, 6-9). A religião de Israel garante a unidade e a exclusividade de Yahveh. Chegou-se a ela a partir de uma concepção politeísta do mundo divino.

A evolução da religião de Israel não é o resultado de uma reflexão filosófica nem de uma concepção teológica sobre a divindade. É uma religião que pelo contrario, se manifesta através do culto e da moral. Vale lembrar que todo o oriente antigo era politeísta, e portanto, favorável às mitologias.

No século VII antes da EC, no decurso do reino de Manasés, se propagou em Israel o culto aos astros (2 Re 21, 3,5) contra o qual Josias (2 Re 23,5) se opôs. Mesmo assim, durante o desterro da Babilônia, o povo comemorou cultos pagãos, lamentou Ezequiel (Ez 8) de que em Jerusalém celebrava- se o culto a Tamuz, cuja morte e ressurreição garantia prosperidade para o país. O povo justificava estas praticas de idolatria porque Yahveh os havia abandonado.

Uma vez criado, o monoteísmo esteve exposto a alguns riscos internos e externos, a saber:

1- O desenvolvimento de certos santuários tradicionais yahvistas ameaçava o carácter exclusivista de Yahveh, por conta da excessiva sacralização de alguns aspectos.

A exemplo do que aconteceu com Abraão e a árvore de tamarino, em Berseba (Gn 21, 33); com Jacó que ergueu uma pedra com estrela, em Betel (Gn 28, 19-22); com Josué que colocou uma grande pedra abaixo de uma árvore, santuário do Senhor em Siquem (Jos 24,26).

Com o passar do tempo, a estrela e a árvore foram sacralizadas, passando a serem consideradas quase substancia divina. De acordo com as inscrições encontradas no século VIII antes da EC, a árvore presente nos santuários yahvistas, era uma potencia sagrada independente, rival de Yahveh. Contra isto os profetas se pronunciaram firmemente: Am 3, 14; Os 3,4; 4,12; 10, 1-3; Miq 5, 12-1; Ezequias e suas reformas (2 Re 18,4) e Josias (2 Re 23,6). Este perigo foi liquidado em Dt 16,21:

“Não plantaras nenhuma árvore na qualidade de Aserah junto ao altar de Yahveh, seu D-us, nem erguera estrela, pois teu D-us detesta que o faças”.


2- Uma outra ameaça se refere à segmentação, pluralidade divina dentro do próprio judaísmo, quando une Yahveh aos mais diferentes santuários, afirmando em cada um, caracteres divinos particulares, com isto, desfavorecendo a presença de um deus único.

A proibição de imagens estava associada a estátuas de culto, mas não a pinturas sobre paredes, cerâmicas ou selos. A arqueologia descobriu um grande numero de imagens que apontavam a religião israelita como não sendo inicialmente aniconica. Tal proibição se relacionava a repulsa ao culto as estrelas (Dt 16,21) e contribuiu para aprofundar a concepção de um D-us único e transcendente. A interdição rechaçou todos os deuses estrangeiros (I Sm 5,2-5), representados por imagens. O Baal, por exemplo, citado em 1 Re 18,27; 2 Re 18,3-5, era um deus poderoso, pois trazia chuva.

Isaias 43, 10-13, diz: “Antes de mim não havia nenhum outro deus, nem depois de mim existirá”, e em Is 44,6-8: “Eu sou o primeiro e sou o ultimo, fora de mim não existe deus algum”.

A deportação da classe dirigente israelita para a Babilónia (2 Re 25,12; Jr 39, 10) e a destruição de Jerusalém, foram interpretadas pelo povo, ora como abandono de Yahveh a Judá (Ez 8,12), ora como atestado da fragilidade de D-us, que não pode defender seu povo dos deuses da Babilónia.

Durante a época do desterro e posterior a ela, tomou-se consciência da universalidade de Yahveh, afirmando a escolha por Israel-Juda. Foi consolidado um vinculo entre criação e eleição, apontado em Dt 4,32-40 e 10, 14-15.

Uma leitura da palavra dos profetas, nos leva crer que a fé em Yahveh não necessitava mais de templo, de terra, nem de monarquia. O D-us de Israel é o D-us do universo e a fé Nele só exige o cumprimento de sua Lei.

Nos livros que formam a Bíblia não encontramos uma concepção mítica em estado puro, o judaísmo é desfavorável aos mitos. O monoteísmo religioso defendido pelos profetas não permite mitos autênticos, porque seus protagonistas são vários deuses.

Quando saíram da dominação egípcia, os judeus eram favoráveis à idolatria. Basta ver o que aconteceu no Monte Sinai, depois que Moisés desceu com as Tábuas da Lei e encontrou o povo adorando o "Bezerro de Ouro". Por que permitir a um povo sensível à idolatria criar imagens? Talvez para que ele pudesse enxergar através dos sentidos.

O segundo mandamento já aparecia nos sete princípios de Nohar (Zohar I, 254): Não praticar idolatria nem servir intermediários entre o homem e D-us.
O segundo mandamento anuncia a proibição contra qualquer tipo de idolatria. O amor a D-us não necessita ser expresso através da adoração de ídolos, mas do estudo da Torá e do cumprimento de seus mandamentos. Todavia, o estudo não deve ser realizado como obediência cega e mecânica, pois seria idolatria.

Até a destruição do Segundo Templo, a idolatria foi considerada um crime, cuja sentença era a pena de morte. Este mandamento influenciou a arte Judaica, direcionando-a para o canto, a musica e a arte de contar histórias.

Em Êxodo, D-us proibiu a feitura de imagens, mas também mandou Moisés botar dois querubins de ouro na Arca da Aliança (Ex 25, 18-20). Ordenou-lhe, fazer uma serpente de bronze e colocá-la por cima duma haste, para curar os que foram mordidos por serpentes venenosas (Num 21, 8-9). Mandou, Salomão enfeitar o templo de Jerusalém com imagens de querubins, palmas, flores, bois e leões (I Reis 6, 23-35 e 7, 29). É um costume em Shavuot enfeitar a casa e a sinagoga com folhas e flores, em lembrança ao florescimento do Monte Sinai.

Em várias passagens bíblicas, D-us mandou fazer imagens: Ex 25, 17-22; Ex 26,1 e 31, 1Rs 6, 23-28; 1 Rs 6, 29s; Nm 21, 4-9; 1Rs 7, 23-26; 1 Rs 7, 28s; mas em outras Ele as proibiu. Inventar imagens não seria idolatria, mas tomá-las como ídolos, sim! Por que?

“Se alguém derramar o sangue do homem, pelo homem se derramará o Seu; porque Deus fez o homem segundo a sua IMAGEM” (Gênesis 9: 6).

Esta afirmativa pode ser pensada como algo que faz distinção entre inventar ídolos e criar imagens. A imagem é produto da imaginação, a idolatria o que acaba com ela. Se por um instante nada soubermos das teorias sobre a matéria e sobre o espírito, se nada soubermos sobre as discussões acerca da realidade ou da idealidade do mundo externo. Estaremos então em presença da imagem, percebida quando abro meus sentidos, não percebida quando os fecho.

Imagem não é o mesmo que ídolo. O ídolo é uma imagem falsa, um simulacro ao qual se atribui vida própria. O profeta Habacuc (2, 18-19) nos diz: "Ai daquele que diz ao pau: Acorda, e a pedra muda: Desperta". O ídolo é copia de algo que não existe. É casca sem ovo. Tomar a cópia por original faz parte da idolatria e alimenta a luxuria.

Rebe Nachman diz que Shavuot nos ajuda pensar a luxuria e descobrir como ela se conectada a nós. Possivelmente, se interconecta conosco, através da cultura narcísica que venera o ego, valoriza uma vida de excitação e reverencia o simulacro. Vivemos uma época interessante, na qual, o café não tem cafeína, a manteiga não tem gordura, o açúcar não tem glicose e as pessoas não tem substancia. Light society.

A idolatria egípcia foi o materialismo, a do nosso tempo é egoica e de consumo. O ego que se sustenta na idolatria é escravo do desejo do outro, que sucumbe quando dele não se liberta.
Quando se proíbe a idolatria tem-se acesso à Revelação, pois os ídolos não são instrumentos de conhecimento, mas obstáculos a ele. A idolatria se vale de falsas noções ou antecipações, quer dizer de preconceitos. Ela gera preconceito, na medida em que impede o pensar diferente sobre o que está posto, como a cólera, que faz do agressor alguém que se sente com poder supremo, um ídolo.

A ilusão é mãe da idolatria e do narcisismo egoico, é um jogo que persiste mesmo quando se sabe que o objeto pressuposto não é real. Ilusão, idolatria e narcisismo formam um triangulo que bloqueia qualquer possibilidade de intermediação. A destruição é intermediada pelo fogo, a fecundidade intermediada pela chuva. O eu intermediado pelo tu, D-us pela Tora.
Sem intermediação não há interpretação ou sentido. A Tora povoa de nomes o silencio criado pela idolatria, despedaçando coração e espírito do materialismo e da luxuria. Se assim for, é possível ligar-se a Palavra Revelada e reinar sobre os fantasmas da ignorância, da prepotência e estupidez.

Na perspectiva do Rebe Nachman, faz-se necessário um HITBODEDUT (isolar-se para falar com D-us). Os cabalistas, recomendam imergir na micve depois de estudos como o de hoje.
A Tora é um organismo vivo que interage conosco. A sabedoria que ela contém, construiu para si uma casa na qual não existem ídolos. D-us olhou para a Tora e criou o mundo a partir dela. A Tora e o mundo são inseparáveis, formam um par, assim como eu e tu.
Sem ídolos e apego é possível conversar.

Rashi e Rambam, explicaram que o povo judeu ouviu de D'us os Dez Mandamentos simultaneamente. Como as palavras foram proferidas todas de uma só vez, o povo não entendeu. Foi então que D'us começou a repeti-los, palavra por palavra, para que ele pudesse compreender. Depois que foi dito o Segundo Mandamento, o povo fez saber a Moisés que não tinha condição de suportar este momento espiritual tão intenso. Daí o pedido para que ele lhe transmitisse o restante. Há quem diga que D-us fez deste modo, para mostrar que os 10 mandamentos têm igual importância entre si.

O Midrash, conta que quando o povo de Israel estava no Sinai para receber a Torá, D'us lhes disse: "Trazei-Me garantias de que ireis preservá-la - e então darei a Torá a vós". Ao que o povo respondeu: "Nossos ancestrais serão nossas garantias". Mas D'us retrucou: "Encontro falhas em vossos ancestrais ... mas trazei a Mim garantias firmes e eu vos entregarei a Torá". O povo respondeu: "Rei do Universo, nossos profetas serão nossas garantias". E o Eterno: "Também em vossos profetas encontro faltas ... Insisto, apresentai diante de Mim boas garantias e a vós entregarei a Minha Torá". Por fim, o povo respondeu: "Nossos filhos serão nossos fiadores e nossas garantias". Ao que o Todo-Poderoso respondeu: "Isto, sim, são garantias excelentes. Em consideração e por amor a eles, vos darei a Minha Torá!".

sábado, 4 de julho de 2009

O Homem Light

Sócrates A. Nolasco

Em nossa primeira sessão, Teo falou-me sobre seu sentimento de insatisfação e em como pensava resolve-lo. Casado, pai de um casal de filhos temia as conseqüências das ações que tomaria. Receava por seus filhos, sua esposa, mas, sobretudo em deixar para trás o que havia construído com aquelas pessoas.

Sentia-se insatisfeito na relação que mantinha com sua mulher. Dizia: "estamos juntos há muito tempo, ela é uma mulher muito exigente". Quando contava sua história referia-se a uma sensação de tempo perdido que desejava resgatar a qualquer custo. Sentia-se preso e condenado a viver dentro desta situação.

Contou-me que durante seu casamento namorou outras mulheres porque assim sentia-se livre. Com todas elas assumia o papel do credor ávido e controlador.

Por alguns instantes viu-se diante de tensões provocadas por julgamentos morais, mas dissipou a todas ao constatar que seus amigos e namoradas adotavam o mesmo procedimento, protocolo de época.

Dentre suas amantes encontravam-se mulheres casadas, que assim como ele procurava resolver suas dificuldades conjugais com amadores.

Seus romances extraconjugais não o deixavam culpado, sentia-se apenas descontente. Teo desconhecia as razões de sua insatisfação, via-se continuamente compelido a agir para tentar escapar do incomodo. Quando se divertia, percebia que seu desagrado se atenuava, mas depois retornava com mais força.

Separou-se de sua mulher com intuito de fazer desaparecer aquele mal-estar, contudo isto não ocorreu. Ele reconhecia como uma restrição à sua liberdade pessoal o longo tempo de permanência dentro deste casamento e as exigências de compromisso feitos pela companheira.

Por sua vez, seu isolamento me chamou atenção. Apesar de ser uma pessoa sociável, ele não se sentia à vontade para falar de sua separação com seus amigos. Suas dúvidas ficavam guardadas com ele. Temia ser visto como fraco.

Frente às tensões deste momento, Teo agia como um atleta. Passou a trabalhar doze horas por dia, sair toda noite e viajar nos finais de semana. Dizia: “me sinto renovado, preciso resgatar o tempo perdido”.

Qualquer mulher que passava diante dele era vista como uma namorada em potencial. Ao olhá-la, comentava com quem quer que seja: “ah, gostosa!”. E complementava: “eu jamais conseguiria viver em uma cidade que não tivesse academia de ginástica e shopping center, ambos transformam mulheres em deusas".

Negava o sofrimento que a separação lhe causava assentando sobre seu rosto um sorriso virtual. Interpretava o mundo como lhe convinha, então, atribuía o fracasso de seu casamento as atitudes de sua ex-mulher, a derrota do fluminense ou ao 11 de setembro. Em sua vida tudo passou a ser aceitável, possível e sem limites. Isto o fazia sentir-se livre.

Quando eu lhe propus pensar sobre todo aquele triathlon social ele reagiu dizendo: "tudo o que eu faço me dá muito prazer, esta excitação não me faz mal algum”.

Minha proposta soava como uma restrição a sua liberdade. Teo pertencia à geração do proibido proibir. Apesar disto, o que considerava violento era pensar sobre si mesmo. “O pensamento limita”, dizia ele.

Lembrando um psiquiatra espanhol, Teo poderia ser considerado um homem light. Um produto de seu tempo. Uma época em que a comida não tem calorias, o café não tem cafeína, a manteiga não tem gordura, o açúcar não tem glicose e o homem não tem substância e conteúdo. Ele passou a viver do gozo sem restrições entorpecido pelo poder e dinheiro.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

A criminalização de Israel.

Sócrates A. Nolasco.

As guerras dão testemunho de que todo poder é triste. Mas, seria possível reinar inocentemente?
Lendo as seções de cartas dos leitores de importantes jornais brasileiros e estrangeiros, publicadas recentemente, durante os dias de conflito que envolveu israelenses e palestinos, percebi que muitas pessoas acreditam que Israel não estaria respondendo a uma serie de ataques realizados pelo Hamas, mas se excedendo no uso de suas forças militares, matando pessoas inocentes. De algum modo, à Palestina é percebida como a vitima da vez. Parte da opinião publica acredita que é possível governar inocentemente.

A estas cartas se somavam varias imagens disponibilizadas na internet e em outras mídias, que privilegiavam os ataques israelenses sobre os palestinos, nas quais homens e mulheres desesperados mostravam-se em situação de abandono gerado por terceiros. Para eles o mal vem de fora da Palestina. Pelo tom parcial presente em cada uma das cartas, perguntei-me o que dentro de cada um dos leitores estaria promovendo a visão de que Israel é o vilão desta guerra. Se Israel quisesse alvejar a população como diziam as cartas, teriam morrido mais de 100 000 pessoas, haja vista que em Gaza existe uma das maiores concentrações humanas do mundo. O esforço realizado era para que isso não acontecesse, como foi constatado.

A participação de todos é necessária para que uma cultura da convivência se estabeleça. Todavia, por que não havia cartas sobre os conflitos no Sudão, na Somália, em Darfur ou na Nigéria, onde milhares de pessoas foram e são assassinadas em guerras étnicas. Ou ainda, por que não havia cartas falando sobre a quantidade de homens que morrem no Brasil por causas externas? Se a questão for números, as estatísticas sobre mortes violentas aqui, são assustadoras. Mas me parece que a questão não são os números. E se não são os números, o que torna a opinião publica um juiz inquieto a procura de justiça?

O argumento que condena as posições defensivas tomadas pelos israelenses, não considera os 10 mil judeus mortos por soldados árabes na época da criação de Israel. Quando o Estado foi criado, os que imigraram para lá, haviam saído dos campos de concentração, não tinham exércitos ou armas para defender-se. Poucas cartas foram escritas sobre isso. Naquela época, a opinião publica européia não se mostrou indignada, mas ela também não havia se posicionado quando os nazistas disseram no Artigo IV, de Nuremberg, que os judeus não eram cidadãos, não tinham direito a trabalhar, nem a ter propriedade, estimulando um boicote maciço a todas atividades desenvolvidas por eles. Em 1938, na conhecida Noite dos Cristais, as escolas judaicas foram fechadas.

As opiniões de intelectuais revisionistas e negacionistas que rejeitam a existência do estado de Israel, têm surtido efeito pois vemos seus ecos chegarem até a opinião publica brasileira. Para escalar, o ódio depende da paixão que emerge de visões de mundo simplistas e parciais. Sabemos que é mais fácil para um homem vencer obstáculos naturais do que dominar a si mesmo, pois vivemos a mercê de nossas próprias paixões. Não significa que as paixões sejam ruins, mas devemos considerar que podemos usá-las mal ou em excesso.

Criminalizar é um dizer apaixonado sobre o mundo. Um dizer que tem mais a ver com o estado emocional de quem fala, do que com o que com a dinâmica dos fatos. Nas sociedades de hoje, descriminalizar é considerado um parâmetro norteador, articulado ao tema do aborto e das drogas. Sob a rubrica da liberdade individual e da dignidade humana, o novo presidente dos EUA apóia a descriminalização do aborto sustentando o argumento de que as mulheres têm o direito de se autodeterminarem. A moral conservadora se opõe a esta idéia, bem como, muitos fundamentalistas.

A opinião publica parece não ver malvadeza nas atitudes do Hamas quando este usa suas crianças e mulheres como escudos e agentes que carregam explosivos no corpo. Ou ainda, quando convocam os mulçumanos através de diferentes mídias do mundo a matarem os judeus. Eu não sei se a opinião publica se lembra do que aconteceu no ano de 1967, no Egito. Juntamente com a Síria e a Jordânia, leis contra os judeus residentes naqueles paises seguiram as mesmas diretrizes das prescritas em Nuremberg. Foi à vez dos mulçumanos expulsarem os judeus que viviam nestes paises, impedindo-os de trabalhar.

O Estado de Israel foi e continua sendo construído com luta e trabalho. Seis milhões de judeus foram mortos antes da sua criação. As negociações com a Inglaterra que se mostrou ávida por adquirir tecnologia para explosão, sinaliza que o estado foi conquistado, não foi dado de mãos beijadas. Não adiantaria dizer: Israel já! Para que o estado se fizesse, esta visão paradisíaca que se alimenta de um único sacrifício só é possível dentro de uma visão ingênua sobre a vida e a natureza humana. A opinião publica que reivindica justiça com parcialidade, o faz porque se identifica com a idéia de que existe um mundo pleno em satisfação, pronto em prazeres e no qual se tem acesso através de um único sacrifício sendo para isto necessário ser uma vitima expiatória. Tal fé precisa de um vilão. A crença de que um novo mundo é possível sem trabalho promove uma fé ingênua de que se explodindo, conquista-se o paraíso.

Se considerarmos os dias de holocausto e o que aconteceu com os judeus ao longo dos séculos, a Historia ensinou que é necessário saber defender-se para continuar vivo. Isto foi o que aprenderam os netos daqueles que foram assassinados pelos nazistas. Talvez a opinião publica pudesse pensar mais a respeito, evitando o impulso de criminalizar Israel.

PATERNIDADE MIDIATICA.

Sócrates Nolasco (Publicado no jornal A Tarde/ Salvador)

No Rio de Janeiro, um menino vive um dilema depois da morte de sua mãe. Ele esta sendo disputado pelo padrasto e por seu pai que mora nos Estados. Por sua vez, Hamlet volta ser encenado nesta mesma cidade. Nesta peça, Shakespeare apresenta o dilema sobre a verdade. Com quem estará a verdade? A peça trata do drama vivido pelo filho que assume a luta pelo assassinato de seu pai. O pai de Hamlet foi morto por um conluio entre a mãe do príncipe e seu marido.

Obama é um presidente, que tem nas mãos a missão de estabilizar uma das maiores economias do mundo. Contudo, ele ouviu o pai do menino e considerou suas angustias. Se estivéssemos na Califórnia, assistiríamos uma corte se posicionando de outra maneira em relação ao pai da criança. Eles têm mérito por isso. No Brasil, pai e mãe não têm os mesmos direitos em caso de litígio por guarda. A mãe é quem leva.

No Rio de Janeiro, advogados dizem que cabeça de juiz é uma caixa preta. E talvez seja, porque deste modo pode-se favorecer a A ou B. Por exemplo, se um pai deseja a guarda de seu filho diante de uma mãe/ padrasto que deseja o mesmo, ele estará em maus lençóis. Aqui, existem homens que lutam anos na justiça para ter o direito de estabelecer um cotidiano com seus filhos, cuja guarda pertence às mães. Filhos que são mantidos reféns da manipulação materna e de sua família. Feliz daquele que vive em um país no qual, o presidente diz que um dos maiores bens em morar na Casa Branca, é poder estar diariamente com suas filhas.

A legislação brasileira é conservadora. Nas varas de família, os direitos entre homens e mulheres não são iguais, principalmente no que tange a paternidade. Se um homem deseja a guarda de seu filho e não quer denegrir ou desqualificar a mãe da criança, ele terá reduzidíssimas chances de sucesso. Cá a maternidade é capitania hereditária.

Este caso ilustra o calvário que acontece no Brasil. Para a justiça brasileira, a mãe continua tendo a hegemonia de poder sobre a criança, pois caso ela falte, surge seu representante, tio Cláudio, o padrasto do menino. Que bom seria se todo pai brasileiro pudesse ter na mídia um espaço para expor sua historia como tem tido o padrasto. A verdade é que o menino tem pai, mas a família da mãe diz que ele não serve.

“O mundo esta fora dos eixos”, disse Hamlet. “Oh! Maldita sorte! Por que nasci para colocá-lo em ordem?” Se pensarmos no menino, não conheço nenhum que gostaria de ver exposto nos jornais desqualificações sobre seu pai. Lamentável. Às vezes o poder e a vaidade fazem das famílias cortes dinamarquesas. E os filhos? Ah! Para os filhos reservamos a loucura.

Hillary não é a mulher de verdade! Obama o mensageiro qualificado.



Sócrates A. Nolasco (publicado no Valor Economico)

A acirrada disputa entre os candidatos democratas, Hillary e Obama, tem feito com que diferentes esforços sejam realizados para se saber o que mais agradará os eleitores. As agencias que cuidam das campanhas de ambos devem estar ávidas para saber como se constitui o “drive” do voto, ou seja, o que fará com que um eleitor escolha o seu novo presidente.
Como já foi dito, os candidatos à presidência dos EUA são franquias mais do que pessoas. Enquanto tais, representam muitos interesses que mesmo que sejam contrários, precisam estar bem articulados entre si. Negros e brancos, mulheres e homens, ricos e remediados, publico e privado são alguns dos segmentos que necessariamente tem de estar contemplados e devem se mostrar harmônicos nos discursos dos candidatos.
A disputa dentro do partido democrata trás dois representantes das chamadas Minorias. Um negro e uma mulher. No imaginário daquele país, encontramos a figura do herói construída sobre a idéia de que um cidadão comum ouvirá um chamamento e deverá realizar uma missão que nele contém. O resultado de sua empreitada beneficiará a todos.

As HQ e o cinema privilegiam esta concepção de herói. Se ele ou ela viverem uma vida de privação e dificuldades, serão bem vindos (Matrix, Homem Aranha, Tarzan). Mas se forem ricos e abastados também serão heróis (Batman ou Lara Croft). O eleitor norte americano tem em mente uma cadeia de idéias que lhe auxilia a formar uma visão de mundo e aferir a ela um valor. Se estas cadeias forem partilhadas por muita gente que as transmite uns aos outros através de algumas historias, temos os mitos e as crenças daquela cultura.

Um eleitor também se vale deste mecanismo para escolher, ele busca o candidato que melhor veste suas projeções. Se assim for ele se identificará com o candidato. Um dramaturgo inglês já nos disse que somos feitos da mesma matéria da qual são feitos os sonhos. Mas quais são os sonhos dos eleitores neste momento?

É interessante se observarmos como este aspecto está presente nas subidas e descidas das pesquisas dos candidatos democratas. Hillary aumentou o numero de mulheres que votariam nela quando em um momento de seu discurso se emocionou e quase chorou. Perdeu eleitores homens quando ficou com a voz embargada. Em um momento seguinte, quando ela vestiu uma postura dura e assertiva, ganhou homens e perdeu eleitoras.

Obama por sua vez trás para a cena política o mesmo que aconteceu durante muitos anos no cinema norte-americano. Não existiam papeis principais para atores negros. Se ele fala diretamente para os negros, perde os eleitores brancos. Já há quem pergunte se ele é negro o suficiente para sustentar uma posição clara para com os negos. Por outro lado, naquele país, há um enorme numero de eleitores brancos. No Brasil, por exemplo, há quem diga que nos esquecemos de que Pelé é negro, se considerarmos o modo como ele fala, transita e aspira o mundo dos brancos.

Obama diz que os EUA têm finalmente um candidato verdadeiramente democrata, usa para isso algumas passagens de sua vida. “Sou filho de uma mulher branca, meu pai nasceu no Quênia e nos deixou quando eu tinha dois anos. Meu padrasto era da Indonésia. Morei em Java e aprendi a falar javanês”. Além de ter uma carreira brilhante, Obama é alguém que veste bem as aspirações e os desejos dos eleitores, favorecendo a identificação deles para com ele. Ele é a síntese multicultural. Obama sabe transitar em vários mundos. Mesmo que para MacCain ele seja alguém que tem estilo mas lhe falta substancia.
Mulheres e Negros foram desprestigiados durante séculos naquele país. Portanto, este aspecto serve bem aos propósitos dos pensamentos de cidadãos comuns que desejam verem-se num ou noutro candidato, usando-os fantasiosamente para sentirem melhor frente as suas aspirações de ascensão social. Com Cinderela foi assim, a bondade e a retidão de caráter lhe valeram uma fada madrinha e um príncipe salvador.

Obama já foi valorizado por seu caráter e por seus valores morais. O lhe valeu uma indicação do jornal inglês New Statesman (2005), como uma das dez pessoas que poderia mudar o mundo. Quando escreveu Audácia e esperança, Obama, resgata o sonho daqueles que buscam ter seus sonhos realizados.

Mesmo que isto não corresponda à vida pregressa dos candidatos, eles também são o que um eleitor quer neles ver. Hillary por exemplo, vem de uma família conservadora e republicana. No passado ela fez campanha para Barry Goldwater. Em Arkansas foi homenageada como a mãe do ano. Mas há quem se refira aos Clintons como aqueles que abusaram do “pardon power”, quando estiveram em 1980 no governo de Arkansas.. Comenta-se que os Clintons comercializaram a presidência dos EUA, distintamente do que fez Truman.

Hillary e Obama alem de candidatos à presidência dos EUA, também são representantes de dois mitos que se fazem parte do ideário da cultura norte americana contemporânea. Enquanto Hillary se aproxima de Hera, a esposa de Zeus, Obama, se parece com Hermes, filho de Zeus, o irmão mais novo de Apolo.

Quando se comove, Hillary abre mão de Hera e se mostra como Helena, a feminilidade que desapareceu da cultura norte-americana retorna através da comoção de uma mulher. Se Hillary expande Hera, suas eleitoras reivindicam a presença de Helena. Enquanto Zeus vivia seu deleite com varias mulheres, Hera se mostrava vingativa e ciumenta as infidelidades do marido. Foi com Hercules que ela se fez conhecer. Filho bastardo de Zeus, ele teve de realizar doze trabalhos duros prescritos por ela.

Considerada a deusa mais importante do panteão grego, Hera teve um esposo que adorava mulheres. Mitólogos apontam que uma das celebres conversas entre Zeus e Hera tratou do propósito e dos prazeres do amor. Hera dizia que os homens sentiam esse prazer mais intensamente do que as mulheres. Zeus afirmava o contrario. Conta-se que para resolver esse impasse Hera e Zeus foram perguntar a Tirésias. Este ultimo, afirmou que as mulheres vivem mais intensamente tais prazeres. Depois disto, Hera o deixou cego.
Sabe-se que os Clintons contrataram os investigadores Terry Lenzner, Jack Palladino e Anthony Pellicano para pressionarem Gennifer Flowers, Monica Lewinsky and Kathleen Willey e fazê-las afastarem-se de Bill.

Obama tem retirado eleitores de Hillary como fez Hermes com as ovelhas de Apolo. Hermes demonstrou grande solicitude para com os rebanhos e seu crescimento. Enquanto um deus mensageiro, Zeus se referia a ele dizendo que percebia quão agradável era para Hermes ser o companheiro dos homens, pois estimava a todos.

Um jornalista norte-americano que apóia Obama se refere a ele dizendo que ele é alguém que é o que parece ser. Conhecido também como Mercúrio, Hermes é considerado o protetor dos viajantes, é o deus das estradas que conhece os caminhos. Ele portanto, não se perderia nelas. Obama tem sido considerado como alguém que tem autoridade moral, alguém que é normalmente extrovertido e geralmente meditativo. Tem uma visão do passado, presente e futuro, mostra-se como um jovem eterno. Se tomarmos Hermes como eixo em torno do qual o imaginário dos eleitores vêem Obama, isto se deve a sua capacidade de compreender significantes e significados, bem como de expressar idéias com clareza e amizade.
Em uma entrevista em 2004, Obama disse que seu nome Barack tem origem na palavra Baruch (hebraico), cujo significado é bendito. Em 2006 destacou como valor, a diversidade de sua família. Bendito e pluralizado são dois aspectos que funcionam bem para a imaginação do eleitorado.

O desafio de Hillary é o de se aproximar de Helena, filha de Zeus, mulher mais bela do mundo, sem que isso a torne uma replica da antiga dona de casa. O de Obama é fazer-se perceber consistente para os conservadores que o vêem como um jovem aspirante. Com Hera, Hillary se aproxima do mundo dos homens, mas cai quando pensa que deve ser melhor do que eles.
Os bilhões de dólares que estão sendo gastos nestas campanhas, poderiam estar sendo usados para resolver parte dos problemas apontados por cada um dos candidatos. Mas se assim for eles não se elegeriam. As coisas não são tão simples assim. A vaidade e a ambição, o poder e o prestigio que este cargo carrega o torna um tesouro no centro desta cultura que privilegia o individualismo neoliberal e o narcisismo a qualquer preço. Democratas e republicanos não são tão diferentes assim, a imagem que cada um apresenta é o que os tornam diferentes uns dos outros. Uma imagem que o vento não levou.







Apagão da Masculinidade


Sócrates Nolasco(*)

APRESENTAÇÃO
Durante o ano de 2001, o governo brasileiro liberou subsídios para criação de programas para combater a violência. Esta foi a opção encontrada por ele, para responder as pressões feitas pela a opinião pública, mobilizada diante dos resultados de algumas pesquisas. Afinal, quais são as novas alternativas encontradas pelo governo para agir diante do crescimento de situações de violência?
Os recursos foram liberados sem levar em conta que os programas a serem criados devem considerar quem são os implicados diretamente nestas situações de violência, como apontam os relatórios produzidos pelo IBGE, IPEA e ONU/Pnud. Nenhuma ação foi deliberada considerando o segmento do sexo masculino da população brasileira. Diferente do que ocorreu no I Fórum Mundial sobre Saúde Masculina, realizado na Áustria, em outubro de 2001, onde foram criadas duas áreas de trabalho.
A primeira se refere a criação do Fórum de Saúde do Homem Europeu e a segunda a formação da Sociedade Internacional para Saúde do Homem. Neste primeiro Fórum, foram apresentados dados sobre a participação dos homens nas 15 principais causas de mortalidade no mundo e se comprovou que são eles que definem majoritariamente os óbitos. Na última década, a expectativa de vida do homem diminuiu, passando a ser 6 anos a menos que a da mulher.
A iniciativa brasileira para a liberação de recursos considerou apenas o quadro geral dos resultados. No que tange às mortes por causas externas (acidentes de trânsito, homicídios, tráfico de drogas, roubo e furto) os dados descrevem cenários de violência não localizados em alguma etnia ou classe social especifica. Todavia, chamam atenção para o modo como o sexo masculino está presente nos mesmos.
No Brasil, cinco pessoas são executadas por dia. E dentre elas 4 são homens. Se uma pessoa for do sexo masculino, negra, pobre e de idade entre 15 e 29 anos, com até 8 anos de escolaridade, tem 5 vezes mais chances de ser assassinada do que uma pessoa que não tenha nenhum destes atributos.
Para uma sociedade que se organiza por segmentos, por que será que não considerou justamente o segmento onde é elevado o índice de envolvimento com situações de violência e problemas de saúde? Este texto procura pensar alguns motivos deste "silêncio".


CRIME E CULTURA
Se não é o afastamento de Deus que está produzindo este quadro, então o que será? Os resultados estatísticos oferecem um primeiro elemento para iniciarmos uma reflexão sobre a questão. Porém, se esta análise se restringir a eles ficamos sem acesso à função positiva que a violência masculina tem para a cultura contemporânea.
A violência presente em determinadas culturas é analisada pelas ciências humanas e sociais segundo diferentes abordagens que buscam maneiras de "exorciza-la". De outro modo, Girard[1] mostra que a violência tem uma função para o grupo social do qual ela emerge. Esta função diz respeito à preservação do grupo mantido através dos sacrifícios "das boas vítimas" que como não foram vingadas devem ser satisfeitas rapidamente através de novos "sacrifícios". Em Girard encontramos uma violência que é de todos ao mesmo tempo em que está em todos, talvez porque sua existência confirme a hipótese de Genet. Segundo ele, a violência existe para acabar com a brutalidade[2]. Uma brutalidade que é fragmento da barbárie presente na desumanização do crime ou do agressor, compreendida superficialmente somente através de referenciais jurídicos ou políticos. Ao desconsiderar que o que produz o crime são configurações emocionais carregadas de espessas camadas de inveja, indiferença, vaidade, arrogância e desesperança, perde-se a possibilidade de entender que a raiva necessária para executá-lo não se restringe apenas àquele que mata, estupra ou trafica, mas também àqueles que dele se beneficiam, como o fazem certas elites políticas e financeiras.
No contemporâneo a "barbárie" pode ser identificada através da concepção simplista sobre o valor do vínculo social, como também através da negligência destas sociedades com a importância que ele tem para seus integrantes. Se o vínculo se restringe às dimensões do mercado e da economia, então não há muito o que fazer para aumentar a capacidade individual para aprimorá-lo. Como conseqüência disto, temos uma cultura que se comunica por meio de um hiperrealismo[3] sem relevos simbólicos e através de imagens sedutoras que nada contribuem para fortalecer o processo de singularização individual.
Entre alguns aspectos da "barbárie" destaco ainda, a banalização dos processos de individuação. O crime é uma tentativa caótica e paradoxal de saída do banal, servindo como agente restaurador de potência para um indivíduo que se sente impotente diante de suas necessidades de singularização. O crime recria no herói o que nele foi banalizado pela cultura, positivando assim, o avesso de sua humanidade. Deste modo, considero que uma das funções da violência é restituir ao indivíduo uma perspectiva de futuro que desapareceu antes mesmo dele existir.
A "barbárie" representa esta ausência de futuro alojada no presente do indivíduo e que a violência tenta dizimar. Quando um homem espanca busca possuir a vontade da vítima e por meio dela, reconstituir um futuro no qual se sente reconhecido por ela ou pelo que ela representa. Por sua vez, quando um agressor age, o faz munido de sentimentos que transbordam e buscam na força física encontrar algum continente para os mesmos. Para este indivíduo, a falta deste continente pessoal exacerba sua necessidade de reconhecimento por parte da vítima, que antes de se tornar uma, carrega consigo este poder de fazer com que o agressor, antes de ser um, sinta-se potente e valorizado. Ele se sente profundamente dependente da vítima e do que ela representa para ele. Em alguns momentos o agressor se sente identificado com a fragilidade da vítima e sua fúria aparece porque a imagem que tem de si como homem não comporta a intensidade deste sentimento. A perversão criminosa presente no agressor é expressão do fracasso de sua capacidade criativa para resolver a tensão entre o sentimento de ser homem e a intensidade da fragilidade que experimenta.
Sem reconhecimento não há futuro, nem para quem tentará encontra-lo na agressão, nem para quem sofrerá as conseqüências da mesma. Portanto, esta ausência de futuro vivida por ambos pode ser identificada tanto em situações objetivas (situações de miséria e segregação), quanto subjetivas( reconhecimento, valor e estima para si mesmo).
As sociedades contemporâneas, ao buscarem através de múltiplos discursos, instrumentalizar possíveis "vítimas", de modo que elas aprendam a se defender de seus "agressores", tendem a fazê-lo preservando aspectos da "barbárie relacional" causadora desta situação. Uma "barbárie" identificada através do modo como os discursos libertários se posicionam diante do princípio de alteridade e consequentemente daqueles que são considerados possíveis agressores. Por exemplo, o feminismo ao mesmo tempo que se estrutura como um movimento que tem intenção de cotejar os agressores, reivindicam uma paridade estatutária com os homens, que são examinados como herdeiros diretos dos mesmos. Uma compreensão superficial e politicamente correta sobre a violência conduz a generalizações sobre a função que a mesma tem para este segmento de indivíduos. Com isto, o problema social que relaciona homens e violência não foi contemplado no rol das políticas públicas traçadas para atuar sobre a violência. Para este segmento de indivíduos, o governo ainda adota ações genéricas, pouco assertivas e inconsistentes para tratar a questão.
Assim sendo, quando as sociedades contemporâneas estabelecem que o sucesso individual só é conquistado por meio de comportamentos agressivos e competitivos, estão adotando determinadas características do comportamento agressivo para estabelecer como seus indivíduos devem caminhar. Com isto, passaram a disseminar uma idéia de militarização do vínculo. Tal postura prescinde dos matizes inerentes ao vinculo social, determinando que, para vencer, o indivíduo deve escolher o lado claro e não o escuro; ser winner e não loser, filiar-se ao ocidente e não ao oriente. Diante desta perspectiva, o indivíduo perde a possibilidade de inventar novas formas de singularização para si mesmo, sua vida e futuro, cabendo a ele cumprir uma agenda cujo roteiro é superficial, polarizado e de aparências.


A VIOLÊNCIA E OS HOMENS
Afinal, por que nos dias de hoje em todas as classes sociais e etnias os homens se envolvem mais em situações de violência do que as mulheres? E por que com tanta intensidade os homens mais novos?
A resposta de que seriam os hormônios ou os genes os responsáveis por tal feito salta como uma explicação fácil mas que não se sustenta como argumento no interior de culturas produtoras do desejo high-tech. Nem a biologia nem a miséria sociológica determinam tais situações. Então, o que poderia estar funcionando como um princípio propulsor? Que sentido tem para um homem morrer jovem, quer seja ele Brasileirinho ou Senna? Será que morrer jovem é um modo de se opor aos valores do mundo tradicional, a exemplo de Casimiro de Abreu e Álvares de Azevedo? Certamente que não.
Contudo, são os homens que definem o comportamento das curvas de violência, quer sejam eles promotores ou vítimas das mesmas. A exemplo disto, temos a polícia que contribui para elevar tanto o índice de homicídio quanto o de suicídio dentro das corporações.
Este quadro só se restringe ao Brasil se considerarmos o valor absoluto dos dados. Todavia, o envolvimento dos homens com situações de violência também está presente nos Estados Unidos, Canadá e países da Europa.
O envolvimento dos homens em situações de violência é um fato que tem por função reparar e manter o ideário contemporâneo que margeia as ações individuais. Se tomarmos como exemplo o argumento central sobre o qual foram concebidos os discursos de minoria, veremos que ele foi composto por um misto de situações de vitimização e reivindicação. A reparação da "vítima" se faz através da incorporação de algum tipo de insígnia/patrimônio do "agressor", quer seja equiparação salarial, étnica, política ou de sexo.
Na cena contemporânea, o herói tradicional é aquele que detém os privilégios que serão partilhados igualitariamente, com quem não usufrui dos mesmos, a exemplo das "minorias". Para as sociedades tradicionais o herói era homem, branco e heterossexual, enquanto que para as sociedades contemporâneas passou a ser mulher, negro e homossexual. Esta mudança nas características do que confere status ao herói não foi suficiente para alterar os ideais de conquista e busca de poder presentes no mundo das tradições. Ao invés disto, eles foram estendidos a outros indivíduos viabilizando para eles o acesso a diferentes posições de prestígio e poder. Reivindicar este privilégio passou a ser um exercício recorrente que confere identidade às minorias.
Os discursos de minoria ao mesmo tempo que fazem uma crítica ao herói tradicional e a seu mundo, mantém através do que reivindicam, algumas características deste herói e seu mundo. Para este texto, considero a masculinidade[4] como sendo uma referência que oferece acesso ao mundo de privilégios, liberdade, conquistas e poder exercidos na esfera pública. O ingresso neste universo conseguido através de agressividade e competição se mantém presente nas sociedades contemporâneas. Assim como a história dos heróis tradicionais pode ser contada por intermédio das guerras, a dos contemporâneos também poderá .
A masculinidade tem uma marca guerreira que não precisa ser necessariamente bélica. A violência tem mostrado que para alguns homens ela ficou reduzida a isto. Contudo, atualmente esta masculinidade bélico-guerreira passou a ser aspirada por muitos, tornando-se um "alimento" para as exigências do politicamente correto. Foi a ideologia do politicamente correto que fez com que um avião jogasse bombas sobre o Afeganistão e em seguida um pacote de comida.
Quando as reivindicações do "ideário do correto" são atendidas, cria-se um mecanismo social que faz com que a masculinidade seja estendida para além das fronteiras do sujeito empírico, passando a ser adotada como uma referência de acesso ao mundo de privilégios e bem-estar. Os indivíduos que se envolvem com mais freqüência em situações de violência são aqueles que sentem que o que os marca acidentalmente[5] (sexo e etnia) não confere positividade a suas identidades, o que dificulta a criação da própria pessoalidade. Os homens ficaram sem pertencer a um segmento valorizado socialmente, diferente do que ocorreu com o negro, a mulher e o homossexual.
Este novo herói tem como função continuar cedendo sua masculinidade para que ela sirva de inspiração às "mudanças de gênero" consolidadas depois do limiar do século XIX e nas décadas que o sucederam.
As questões de "gênero" são herdeiras do dispositivo criado pelas ciências humanas e sociais que permitiu que a representação do sujeito empírico fosse descolada dele mesmo, fazendo com que, por exemplo, o sexo biológico se desarticulasse de seus significados dentro da cultura. Com isto, masculinidade e feminilidade passaram a ser denominações utilizadas para referir-se a homem e mulher independente da marca biológica. Assim, foi possível um sexo aspirar o que a cultura definia como sendo do outro. Várias falas se ergueram para realizar tal empreitada ampliando este modelo. Este também passou a ser adotado para sistematizar reivindicações étnicas e de orientação homoerótica.
O exercício de descolamento do sexo de sua representação é recorrente na sociedade contemporânea. Para a sociedade do efêmero, o acidente humano não é o que funda a relação do indivíduo com ele mesmo. Deste modo, deixou de ser relevante se ele (ela) nasce - homem ou mulher, branco ou negro. Para a perspectiva que imagina o indivíduo como uma construção social, isto pouco importa. Sexo ou etnia não têm relevância para uma sociedade que se denomina libertária, igualitária e soberana quanto a liberdade de escolha e expressão.


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisando o envolvimento dos homens com situações de violência, nos deparamos com um fenômeno que aglutina em torno de si indivíduos que sentem-se sem escolha e sem história. Para eles, a violência é a possibilidade de expressão do que foi e é a história de suas vidas, uma história cuja narrativa apresenta o percurso de um herói sem rumo e sem futuro.
A irracionalidade presente nas situações de violência, por outro lado nos faz pensar no esforço empreendido pelas sociedades tradicionais para contê-la e com isto, proteger seus integrantes a fim de lhes assegurar prosperidade. Nestas sociedades, como nos mostra Girard, o sagrado é uma conseqüência deste esforço, na medida em que se mostra eficiente para inibir os riscos da banalização do que confere unidade, sentido e significado social. Desta forma, são favorecidos os vínculos de coesão e pertencimento.
Um dos efeitos deixados pelas marcas do sagrado diz respeito ao valor positivo que ele confere à representação social masculina circulante nas sociedades tradicionais. As sociedades contemporâneas mudaram radicalmente esta dinâmica ao apresentarem o herói masculino[6] como decrépito e sem viço. As narrativas sobre o herói masculino contemporâneo desapareceram nestas sociedades, bem como, nelas o sagrado perdeu sua força simbólica e de comunicação, necessárias para conter situações de violência.
Dentre as funções do sagrado, existe uma que se presta a produzir operadores sociais que sirvam de mediadores entre os sistemas de crenças e o comportamento dos indivíduos. As representações de homem e mulher são um exemplo de elementos usados por estes operadores. As representações sociais servem para compor narrativas usadas pelos indivíduos no cotidiano. Por meio delas, eles poderão sentir-se valorizados e mantenedores da cultura da qual fazem parte.
Os mitos foram operadores eficientes para cumprirem esta tarefa. Na falta de um mito masculino contemporâneo que cumpra a função de dar suporte as transições para a adultez, a violência masculina cresce e se organiza em torno de uma crença que afirma que se um homem que não serve para servir não serve para viver. Talvez o descaso para com estas questões e o compromisso social exclusivamente voltado para a problemática da mulher, demonstrem que há uma expectativa de extermínio da figura masculina no contemporâneo.
A partir do individualismo moderno a representação social masculina entra em declínio mergulhando em um longo processo de decadência. Com o fim dos "metarrelatos", este declínio chega até o final do século XIX desencadeando "crises de identidade" e, posteriormente, a "crise masculina". Uma crise necessária que beneficiou a consolidação dos movimentos sociais de emancipação permitindo a positivação de identidades até então negativadas (mulher, etnias e homossexuais). Por outro lado, tal crise tornou-se um dispositivo promotor de situações violentas na medida em que, para as sociedades ocidentais, ser homem passou a significar sinônimo de truculência , boçalidade ou daquele que é politicamente incorreto.
As sociedades de hoje analisadas pela perspectiva de gênero passaram a usar no mínimo duas "masculinidades". Dentre seus fragmentos, um deles se firma como um conceito que representa o mundo das tradições combatido pelos discursos de "minoria", com a qual os homens foram identificados. O outro sinaliza as conquistas do mundo civilizado e seu modo de acesso a ele. Este último serve como parâmetro para medir os avanços e conquistas dos direitos indivíduais. É comum em alguns textos feministas a presença da denominação "masculinidades", que não é um operador social, mas foi criado para dizer que há muitas formas de ser homem. Como se fosse possível em algum momento da história existir uma única maneira de sê-lo. Todavia, esta literatura não trata o feminino dentro da mesma prerrogativa conceitual e portanto, não encontraremos um termo correspondente denominado "feminilidades". Talvez porque o feminino enquanto um conceito não deva fragmentar-se como foi feito com a masculinidade, já que sua função é manter a unidade necessária para aglutinar a diversidade das questões dos sujeitos empíricos do sexo feminino e servir como porta voz para o movimento de mulheres. A afirmativa "toda mulher tem direito a ..." ou ainda " a violência contra a mulher..." trata ao mesmo tempo do sujeito empírico e de seu correspondente representacional no interior das culturas. Neste caso, não houve uma descolamento destas duas dimensões. Por sua vez, mulher e feminilidade vão se tornando no contexto contemporâneo, cada vez mais designações distintas. A denominação mulher se firma diante da do feminino que passa a ser considerada uma nomeação tipicamente masculina e deve ser preterida pelo sujeito empírico. O desaparecimento do feminino[7] e do que se opõe a ele, pode ser pensado como expressão do fim do princípio de alteridade, fundador e mediador do vínculo social. A violência surge para tentar impedir este fim.
Porém, a associação do conceito de homem com o de feminilidade passa a ser recorrente nos textos sobre gênero que tomam esta associação como referência para se falar de uma "nova" representação para os homens. Esta denominação segue por um outro viés que não é o da alteridade.
A violência masculina enquanto ato é expressão da confusão contemporânea do gender bender que passou a restringir o ser homem a situações agressivas e violentas. Esta perspectiva retrata o fracasso de uma sociedade que tenta abrir mão de seu destino alteritário, passando a definir que nela, lugar de homem é lugar do Mal. Um mal expresso por mortes que enquanto violência, é a masculinidade que os mais jovens tentam possuir.
Diante da falta de representações masculinas positivas, a violência emerge como um recurso para tirar alguns homens do "apagão" em que se encontram. Por outro lado, esta cadeia de mortes aponta para um outro fracasso destas sociedades do presente. Cada vez mais desaparece de dentro delas o investimento necessário para crescerem vínculos de gratidão, respeito, generosidade e cooperação. Tais vínculos poderiam ser o resultado do compromisso firmado pelos homens mais velhos com os mais novos. Contudo, as culturas ainda não conseguiram produzir lideranças com este calibre de civilidade. Algumas lideranças contemporâneas demonstram, pelos seus atos, que ainda têm a mesma organização emocional da barbárie.
A cada homem que sucumbe em situações de violência tomba com ele dimensões do feminino naufragado em contextos regidos pela ausência de alteridade. O tom acusatório e depreciativo, comum de se encontrar nos diálogos contemporâneos sobre a presença dos homens no mundo, retratam bem este estado de coisas. Atualmente vigora um despreparo e um descompromisso estratégico com estas questões que fazem com que a população de homens diminua.
Para quem deseja de fato compreender por que um homem mata e agride, é necessário pensar nos processos culturais que criam soldados e os ensinam a puxar o gatilho. Também é necessário pensar nas cifras produzidas pelas nações que investem pesado na industria de armamento e de guerras. E na ausência de generosidade das lideranças brasileiras, que desprezam por exemplo, o esforço criativo de meninos malabaristas que atuam como circenses nos semáforos do Rio de Janeiro, demonstrando dignidade.
Para quem pretende auxiliar estes meninos a serem homens que não substituirão os malabares por um revolver e que portanto, desaprenderam o ofício de recorrer a ele como fazem os exércitos, certamente que o caminho não será disparar sobre eles o gatilho de uma arma certeira apontada para sua alteridade. Mesmo que o tiro seja de batom.


Referências bibliográficas
BAUDRILLARD, Jean. O Crime Perfeito. Lisboa: Relógio D' Água Editores, 1991.
__________ . A transparência do Mal: ensaios sobre fenômenos extremos. 2 ª edição. Campinas: Papirus, 1992.
GIRARD, René. A violência e o sagrado. São Paulo: Editora UNESP, 1990
NOLASCO, Sócrates. De Tarzan a Homer Simpson: banalização e violência masculina em sociedades contemporâneas ocidentais. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2001.



(*) Psicólogo, Professor Doutor ECO/ UFRJ; Coordenador do Programa PAI - 24 hs e autor dos livros: De Tarzan a Homer Simpson: banalização e violência masculina; O mito da masculinidade A desconstrução do masculino; O Primeiro Sexo e outras mentiras sobre o segundo.


[1] GIRARD, René. A Violência e o Sagrado
[2] Desta parte em diante do texto passarei a adotar a palavra barbárie para me referir a uma dimensão desta brutalidade. Esta denominação está sendo utilizada porque demarca um conjunto de relações entre indivíduos estabelecidas a partir da negação do princípio de alteridade. Aqui a designação barbárie não está restrita a um determinado momento da história, mas como resquícios de um modo de relação que sobrevive entre os indivíduos no mundo civilizado.
[3] BAUDRILLARD, Jean. A Transparência do Mal
[4] Nestes termos a masculinidade é uma idéia que agrega em torno de si uma série de imagens que disponibilizam para o indivíduo o modo como ele deve agir diante das situações que enfrenta na vida. Para tanto as culturas organizaram mitos e heróis oferecendo a seus integrantes recursos para lidarem com eles mesmos e os grupos no qual se inserem.
[5] Considero como sendo aquela que o indivíduo não escolhe mas, apesar disto, nasce com ela. Incluo ainda, como parte desta marca, aspectos herdados de seus ancestrais e as tradições pertencentes aos mesmos.
[6] NOLASCO, Sócrates. De Tarzan a Homer SImpson
[7] BAUDRILLARD, Jean. O Crime Perfeito

Revista Nova.

ENTREVISTA com Sócrates A. Nolasco.

Livros:

-O Primeiro Sexo e outras mentiras sobre o Segundo, 2006. (Best Seller).
-De Tarzan a Homer Simpson: banalização e violência masculina, 2001. (Rocco).
-A Desconstrução do Masculino, 1996. (Rocco).
-O Mito da Masculinidade, 1992. (Rocco).

1-É mais fácil para o homem que morava sozinho se adaptar às tarefas domésticas do dia-a-dia e ajudar a esposa do que para um homem que morava com a mãe e tinha sua refeição pronta todas as noites?

Incorporar tarefas domésticas como parte de uma rotina que faz da vida adulta é um aprendizado que começa na infância. Isto serve tanto para homens, quanto para mulheres. As pessoas se tornam adultas na medida em que aprendem a cuidar delas mesmas, bem como das escolhas que fizeram na vida, sejam elas profissionais ou afetivas.
Para um adulto, a casa representa um lugar no mundo onde ele descansa, se alimenta, mas sobretudo onde produz sonhos e elabora desejos. Ela pode ser expressão de intimidade, autonomia e de algo novo. Todavia, existem pessoas, mães e filhos, que desejam manter tudo como está, pesando que assim não correrão riscos.
Para tanto, eternizarão uma “brincadeira” apreciada na infância: a de mãe e filho(a).


2. Os homens estão mais participativos nas tarefas domésticas? Alguns ainda se sentem incomodados por acreditar que essas sejam funções femininas? Por que?

O incomodo se caracteriza mais por serem tarefas que não tem fim, ou são repetitivas e pouco criativas, do que por ser de mulher. Alguns homens dizem que existe sempre algo melhor para fazer do que executar uma rotina doméstica. Os homens de hoje são mais participativos quanto às rotinas da casa do que foram seus pais. Isso pode não estar à altura do que deseja uma mulher, pois elas se sentem sobrecarregadas. Contudo, a carga que elas sentem por conta da dupla jornada na maioria das vezes atribuída a pequena participação dos homens, também diz respeito ao modelo social que atravessa os casais de hoje, exigindo muito dos mesmos. Com isto, desenvolveu-se a crença de que fazendo mais se terá segurança no emprego, na família e na educação dos filhos. Isto é impossível!
No Brasil, os meninos participam muito pouco das tarefas domésticas, e atualmente as meninas também. Podemos imaginar como será a casa de ambos quando crescerem, se até lá não existirem as empregadas domésticas.


3. Algumas vezes a mulher, por ter mais familiaridade com a dinâmica da casa assume o papel de “mandona”, dá ordens todo momento de como ele deve cuidar do espaço que é comum aos dois. Essa atitude está correta?

O poder sempre interessou a homens e mulheres. Não temos dúvida disso se observarmos a cena publica. A questão é que ela também se coloca no âmbito privado. Durante a história, a casa pertenceu a uma mulher. Tudo que nela existe ficou associado ao feminino. Arrumar, lavar, cozer, enfim isso é uma demarcação de território e espaço.
Acreditou-se até que há uma identidade, um jeito que é próprio de mulher associado a ela. Certa vez, um homem me contou uma historia sobre sua sogra. Ela percebendo que ele cozinhava bem, sabia cuidar da casa, vestir e pentear os filhos, lhe disse:
- Você deveria ter nascido mulher!
Quando há xingamentos ouvimos: “seu filho da mãe!”
Do mesmo modo que o filho é uma posse, um bem que coube a mulher na partilha do mundo, tudo o que está na cena publica pertence aos homens. Muitos juizes e juizas ainda entendem as coisas deste modo quando dão a guarda às mães.
Essa visão de mundo faz parte de um conjunto de crenças que limita e empobrece a experiência humana.


4. Por que quase nunca parte do homem a iniciativa de ajudar nas tarefas do lar?

Primeiramente, porque nunca se esperou isso de um homem. As famílias não educam os meninos acreditando que isso tenha um valor positivo para eles. Portanto, eles não se identificarão com isso.
De um homem era exigido que ele protegesse, provesse a família existisse. Disseram para eles que se desempenhassem bem seu papel teriam a recompensa de serem eternamente amados. Mas esse prêmio nunca chegou. E os homens foram atrás dele em outro lugar. Amantes, amigos de bar, trabalho, era importante acreditar que seria possível encontrá-lo, pois junto ao reconhecimento estaria a estima de seu valor. O lar pertence à mulher, não há quem diga: “mãe é mãe!” E o pai?
A cultura precisa inventar um outro modelo de família para ser divulgado e valorizado além da cena publicitária.


5. Alguns homens brincam dizendo que casamento é sinônimo de fim do sexo. É verdade? Por que alguns pensam assim?

No casamento o sexo pode coroar uma relação de intimidade. Essa conexão está presente em diferentes histórias que eu apresento em meu ultimo livro: O Primeiro Sexo.
O sexo é subutilizado quando empregado para aplacar angústias, conter medos, confirmar identidades, reparar sofrimentos ou promover vinganças. Na literatura ele já esteve associado à traição, morte, guerras, e ao impossível. Nos dias de hoje, é grande o interesse que se tem por ele, sendo difícil saber se ele nos liberta ou nos escraviza?
No casamento, quando um homem se sente amado, querido e valorizado, o sexo com sua mulher melhorará, pois neste contexto ele gera alegrias. Do contrário, se transforma em uma loteria, cuja função é tentar encontrar o amor que falta.
Posto desta forma, quanto mais sexo eles fizerem, maiores serão suas chances serem reconhecidos. Mas, na medida em que isso não ocorre o casamento se transformou no evento que extinguirá o sexo, não pelo sexo em si, mas sobretudo, porque o casamento não lhes trouxe o amor.
Há homens e mulheres que não sabem o que é amar, e possivelmente viverão sem adquirir a sabedoria necessária para tal. Isto porque só conhecem o valor do amor aqueles que se sentem bem amados. O sexo mecânico ficou como um prêmio de consolação para os que são acompanhados freqüentemente pelo sentimento de perda do amor.


6. O que muda na cabeça do homem ao casar? Depois que casa, do que ele sente mais falta?

Possivelmente sente falta do que esperava encontrar. Quem não está casado consigo mesmo dificilmente conseguirá se envolver nessa empreitada. O casamento sempre foi um desafio para homens e mulheres. A humanidade precisou dele para avançar e para isso não poupou esforços para cercá-lo com um cinturão moral e religioso. Na medida que esse cinturão foi retirado podemos perceber que dificuldades são essas, elas não são um privilegio de nosso tempo.
A perda de fé no casamento tem mais haver com aquilo que ele propicia ao casal enxergar: suas limitações, seus desafios e frustrações. O casamento é apenas uma experiência que para ser satisfatório dependerá do que cada um traz na bagagem pessoal.
A mulher chega no casamento pensando que agora ela terá um novo começo para sua vida. Para um homem ele representa a conclusão de um caminho.
O sentimento de perda pode estar associado às expectativas impossíveis de serem realizadas, as incapacidades de se lidar com problemas da vida e sobretudo, pela falta de certeza de que se é verdadeiramente amado. No casamento, só o sexo pode conter a intensidade do amor.