Bem vindo a este espaço de troca e reflexão de ideias.

O QUE SENTIMOS PODE SER FALADO.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Shavuot 5769

Sócrates Nolasco.

Considerações sobre o 2o. MANDAMENTO.


Êxodo 20:3 - Não terá outros deuses diante de mim.
Êxodo 20:4 - Não fará para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.
Êxodo 20:5 - Não as adorará, nem lhes dará culto; porque eu sou o senhor, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem.
Êxodo 20:6 - Faço misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus mandamentos.

Uma direção para a fé (Emuna).


A luta de Jacó com D-us em Penuel (Gn 32, 23-33), pode ser interpretada como sendo o encontro entre dois grupos: o de Jacó (Israel) e o de Josué.

Em Peni-El estes dois grupos se depararam pela primeira vez, e declaram fidelidade a Yahveh (Jos 24, 14-15). No monte Ebal, havia um santuário frequentado por cananeus e israelitas conjuntamente. Josué obrigou o povo a eleger entre os deuses cananeus e amoreus aquele que os tiraria do Egito.

A partir de Josué pode-se considerar Yahveh o D-us de Israel, celebrado no canto de Débora.

A religião judaica passou da monolatria para o monoteísmo. Chegou-se ao monoteísmo através dos deuses tradicionais, bem como de um longo processo de maturação religiosa. Por esta razão, o primeiro mandamento reafirma isto (Ex. 20, 2-4 e Dt 5, 6-9). A religião de Israel garante a unidade e a exclusividade de Yahveh. Chegou-se a ela a partir de uma concepção politeísta do mundo divino.

A evolução da religião de Israel não é o resultado de uma reflexão filosófica nem de uma concepção teológica sobre a divindade. É uma religião que pelo contrario, se manifesta através do culto e da moral. Vale lembrar que todo o oriente antigo era politeísta, e portanto, favorável às mitologias.

No século VII antes da EC, no decurso do reino de Manasés, se propagou em Israel o culto aos astros (2 Re 21, 3,5) contra o qual Josias (2 Re 23,5) se opôs. Mesmo assim, durante o desterro da Babilônia, o povo comemorou cultos pagãos, lamentou Ezequiel (Ez 8) de que em Jerusalém celebrava- se o culto a Tamuz, cuja morte e ressurreição garantia prosperidade para o país. O povo justificava estas praticas de idolatria porque Yahveh os havia abandonado.

Uma vez criado, o monoteísmo esteve exposto a alguns riscos internos e externos, a saber:

1- O desenvolvimento de certos santuários tradicionais yahvistas ameaçava o carácter exclusivista de Yahveh, por conta da excessiva sacralização de alguns aspectos.

A exemplo do que aconteceu com Abraão e a árvore de tamarino, em Berseba (Gn 21, 33); com Jacó que ergueu uma pedra com estrela, em Betel (Gn 28, 19-22); com Josué que colocou uma grande pedra abaixo de uma árvore, santuário do Senhor em Siquem (Jos 24,26).

Com o passar do tempo, a estrela e a árvore foram sacralizadas, passando a serem consideradas quase substancia divina. De acordo com as inscrições encontradas no século VIII antes da EC, a árvore presente nos santuários yahvistas, era uma potencia sagrada independente, rival de Yahveh. Contra isto os profetas se pronunciaram firmemente: Am 3, 14; Os 3,4; 4,12; 10, 1-3; Miq 5, 12-1; Ezequias e suas reformas (2 Re 18,4) e Josias (2 Re 23,6). Este perigo foi liquidado em Dt 16,21:

“Não plantaras nenhuma árvore na qualidade de Aserah junto ao altar de Yahveh, seu D-us, nem erguera estrela, pois teu D-us detesta que o faças”.


2- Uma outra ameaça se refere à segmentação, pluralidade divina dentro do próprio judaísmo, quando une Yahveh aos mais diferentes santuários, afirmando em cada um, caracteres divinos particulares, com isto, desfavorecendo a presença de um deus único.

A proibição de imagens estava associada a estátuas de culto, mas não a pinturas sobre paredes, cerâmicas ou selos. A arqueologia descobriu um grande numero de imagens que apontavam a religião israelita como não sendo inicialmente aniconica. Tal proibição se relacionava a repulsa ao culto as estrelas (Dt 16,21) e contribuiu para aprofundar a concepção de um D-us único e transcendente. A interdição rechaçou todos os deuses estrangeiros (I Sm 5,2-5), representados por imagens. O Baal, por exemplo, citado em 1 Re 18,27; 2 Re 18,3-5, era um deus poderoso, pois trazia chuva.

Isaias 43, 10-13, diz: “Antes de mim não havia nenhum outro deus, nem depois de mim existirá”, e em Is 44,6-8: “Eu sou o primeiro e sou o ultimo, fora de mim não existe deus algum”.

A deportação da classe dirigente israelita para a Babilónia (2 Re 25,12; Jr 39, 10) e a destruição de Jerusalém, foram interpretadas pelo povo, ora como abandono de Yahveh a Judá (Ez 8,12), ora como atestado da fragilidade de D-us, que não pode defender seu povo dos deuses da Babilónia.

Durante a época do desterro e posterior a ela, tomou-se consciência da universalidade de Yahveh, afirmando a escolha por Israel-Juda. Foi consolidado um vinculo entre criação e eleição, apontado em Dt 4,32-40 e 10, 14-15.

Uma leitura da palavra dos profetas, nos leva crer que a fé em Yahveh não necessitava mais de templo, de terra, nem de monarquia. O D-us de Israel é o D-us do universo e a fé Nele só exige o cumprimento de sua Lei.

Nos livros que formam a Bíblia não encontramos uma concepção mítica em estado puro, o judaísmo é desfavorável aos mitos. O monoteísmo religioso defendido pelos profetas não permite mitos autênticos, porque seus protagonistas são vários deuses.

Quando saíram da dominação egípcia, os judeus eram favoráveis à idolatria. Basta ver o que aconteceu no Monte Sinai, depois que Moisés desceu com as Tábuas da Lei e encontrou o povo adorando o "Bezerro de Ouro". Por que permitir a um povo sensível à idolatria criar imagens? Talvez para que ele pudesse enxergar através dos sentidos.

O segundo mandamento já aparecia nos sete princípios de Nohar (Zohar I, 254): Não praticar idolatria nem servir intermediários entre o homem e D-us.
O segundo mandamento anuncia a proibição contra qualquer tipo de idolatria. O amor a D-us não necessita ser expresso através da adoração de ídolos, mas do estudo da Torá e do cumprimento de seus mandamentos. Todavia, o estudo não deve ser realizado como obediência cega e mecânica, pois seria idolatria.

Até a destruição do Segundo Templo, a idolatria foi considerada um crime, cuja sentença era a pena de morte. Este mandamento influenciou a arte Judaica, direcionando-a para o canto, a musica e a arte de contar histórias.

Em Êxodo, D-us proibiu a feitura de imagens, mas também mandou Moisés botar dois querubins de ouro na Arca da Aliança (Ex 25, 18-20). Ordenou-lhe, fazer uma serpente de bronze e colocá-la por cima duma haste, para curar os que foram mordidos por serpentes venenosas (Num 21, 8-9). Mandou, Salomão enfeitar o templo de Jerusalém com imagens de querubins, palmas, flores, bois e leões (I Reis 6, 23-35 e 7, 29). É um costume em Shavuot enfeitar a casa e a sinagoga com folhas e flores, em lembrança ao florescimento do Monte Sinai.

Em várias passagens bíblicas, D-us mandou fazer imagens: Ex 25, 17-22; Ex 26,1 e 31, 1Rs 6, 23-28; 1 Rs 6, 29s; Nm 21, 4-9; 1Rs 7, 23-26; 1 Rs 7, 28s; mas em outras Ele as proibiu. Inventar imagens não seria idolatria, mas tomá-las como ídolos, sim! Por que?

“Se alguém derramar o sangue do homem, pelo homem se derramará o Seu; porque Deus fez o homem segundo a sua IMAGEM” (Gênesis 9: 6).

Esta afirmativa pode ser pensada como algo que faz distinção entre inventar ídolos e criar imagens. A imagem é produto da imaginação, a idolatria o que acaba com ela. Se por um instante nada soubermos das teorias sobre a matéria e sobre o espírito, se nada soubermos sobre as discussões acerca da realidade ou da idealidade do mundo externo. Estaremos então em presença da imagem, percebida quando abro meus sentidos, não percebida quando os fecho.

Imagem não é o mesmo que ídolo. O ídolo é uma imagem falsa, um simulacro ao qual se atribui vida própria. O profeta Habacuc (2, 18-19) nos diz: "Ai daquele que diz ao pau: Acorda, e a pedra muda: Desperta". O ídolo é copia de algo que não existe. É casca sem ovo. Tomar a cópia por original faz parte da idolatria e alimenta a luxuria.

Rebe Nachman diz que Shavuot nos ajuda pensar a luxuria e descobrir como ela se conectada a nós. Possivelmente, se interconecta conosco, através da cultura narcísica que venera o ego, valoriza uma vida de excitação e reverencia o simulacro. Vivemos uma época interessante, na qual, o café não tem cafeína, a manteiga não tem gordura, o açúcar não tem glicose e as pessoas não tem substancia. Light society.

A idolatria egípcia foi o materialismo, a do nosso tempo é egoica e de consumo. O ego que se sustenta na idolatria é escravo do desejo do outro, que sucumbe quando dele não se liberta.
Quando se proíbe a idolatria tem-se acesso à Revelação, pois os ídolos não são instrumentos de conhecimento, mas obstáculos a ele. A idolatria se vale de falsas noções ou antecipações, quer dizer de preconceitos. Ela gera preconceito, na medida em que impede o pensar diferente sobre o que está posto, como a cólera, que faz do agressor alguém que se sente com poder supremo, um ídolo.

A ilusão é mãe da idolatria e do narcisismo egoico, é um jogo que persiste mesmo quando se sabe que o objeto pressuposto não é real. Ilusão, idolatria e narcisismo formam um triangulo que bloqueia qualquer possibilidade de intermediação. A destruição é intermediada pelo fogo, a fecundidade intermediada pela chuva. O eu intermediado pelo tu, D-us pela Tora.
Sem intermediação não há interpretação ou sentido. A Tora povoa de nomes o silencio criado pela idolatria, despedaçando coração e espírito do materialismo e da luxuria. Se assim for, é possível ligar-se a Palavra Revelada e reinar sobre os fantasmas da ignorância, da prepotência e estupidez.

Na perspectiva do Rebe Nachman, faz-se necessário um HITBODEDUT (isolar-se para falar com D-us). Os cabalistas, recomendam imergir na micve depois de estudos como o de hoje.
A Tora é um organismo vivo que interage conosco. A sabedoria que ela contém, construiu para si uma casa na qual não existem ídolos. D-us olhou para a Tora e criou o mundo a partir dela. A Tora e o mundo são inseparáveis, formam um par, assim como eu e tu.
Sem ídolos e apego é possível conversar.

Rashi e Rambam, explicaram que o povo judeu ouviu de D'us os Dez Mandamentos simultaneamente. Como as palavras foram proferidas todas de uma só vez, o povo não entendeu. Foi então que D'us começou a repeti-los, palavra por palavra, para que ele pudesse compreender. Depois que foi dito o Segundo Mandamento, o povo fez saber a Moisés que não tinha condição de suportar este momento espiritual tão intenso. Daí o pedido para que ele lhe transmitisse o restante. Há quem diga que D-us fez deste modo, para mostrar que os 10 mandamentos têm igual importância entre si.

O Midrash, conta que quando o povo de Israel estava no Sinai para receber a Torá, D'us lhes disse: "Trazei-Me garantias de que ireis preservá-la - e então darei a Torá a vós". Ao que o povo respondeu: "Nossos ancestrais serão nossas garantias". Mas D'us retrucou: "Encontro falhas em vossos ancestrais ... mas trazei a Mim garantias firmes e eu vos entregarei a Torá". O povo respondeu: "Rei do Universo, nossos profetas serão nossas garantias". E o Eterno: "Também em vossos profetas encontro faltas ... Insisto, apresentai diante de Mim boas garantias e a vós entregarei a Minha Torá". Por fim, o povo respondeu: "Nossos filhos serão nossos fiadores e nossas garantias". Ao que o Todo-Poderoso respondeu: "Isto, sim, são garantias excelentes. Em consideração e por amor a eles, vos darei a Minha Torá!".

Nenhum comentário:

Postar um comentário