Bem vindo a este espaço de troca e reflexão de ideias.

O QUE SENTIMOS PODE SER FALADO.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

PAI, POR QUE NÃO TE ABANDONEI MAIS CEDO?

- Fico exausto quando encontro meu pai. Ele fala dele o tempo todo com um entusiasmo sufocante.
- Eu o imaginava diferente disto.
O barulho deste restaurante está me deixando tonto, eu não consigo te ouvir. Por quê essa gente fala tão alto?
Garçom, nós vamos pedir.
- Max, estar com meu pai é o mesmo que dobrar o volume de voz destas pessoas. Mesmo quando estamos frente a frente, fala como se estivesse diante de uma platéia. Ele fica entediado quando conversa só comigo, precisa de público para mostrar que é o primeiro em tudo que faz.
Quando está com raiva descarrega em mim. Eu acabo me sentindo responsável por isto. Ele só fica calmo quando me diminui, e põe em dúvida o que faço. Eu sei que pratico o mesmo com meu filho, mas não consigo fazer diferente.

Ethan tem um pai egoísta e competitivo que não admite ser superado por ninguém. Cada tropeço do filho ele comemora como uma consagração de sua superioridade. Considera-se um modelo de pai, marido e cidadão sentindo-se mais inteligente, preparado e criativo que qualquer pessoa. Ethan só conseguia sua atenção quando se comportava como um devoto zeloso que o elogiava continuamente sem afrontá-lo em sua vaidade.
Ele diz que seu pai gosta de poder e de interpretar o mundo a sua maneira, reafirmando o tempo todo que não existe um modo melhor que o seu para compreender a vida. Educou seus filhos para que fossem platéias de suas histórias, mantendo-os subordinados a ele através da dependência financeira ou emocional. Inseguros, seus filhos se enrolam facilmente. Nenhum deles é capaz de suportar a solidão sobre a qual se funda a existência e por isso, mantêm-se atrelados ao pai às custas de mergulharem suas vidas mais na infelicidade do que na prosperidade.
Ethan preservou este referencial paterno perfilando-se no seu avesso, ao se tornar pai. Suas atitudes com seu filho são reações ao modo como o pai lhe tratou: é bacana porque seu pai não foi; só diz sim porque apenas recebeu não. Tornou-se permissivo e liberal por considerar a autoridade paterna algo ruim. Deste modo, não estabelece nenhuma distinção entre ele e o rebento, vertendo para este último tudo o que lhe falta. O pimpolho é tratado do modo como Ethan gostaria de ter sido.
Sem a lucidez necessária, transformou-se num pai mais problemático ainda. Ele é um forte candidato a ser mais celerado do que seu pai, haja vista que suas atitudes com seu filho fortalecem as distorções emocionais deixadas pelas malfeitorias paternas.
Ethan não aprendeu que admiramos nossos pais por eles terem sido justos e honestos: caso contrário, é melhor apenas suportá-los. Diante disto, aquele que não tem um bom pai deve arranjar um. Foi o que fez Dante quando escolheu Virgílio para acompanhá-lo na travessia do labirinto da vida, conduzindo-o até sua Beatriz.
Se ele compreendesse suas próprias motivações, possivelmente teria conseguido imaginar soluções melhores e mais criativas para sua vida. Falta-lhe sensatez para perceber que seu pai esteve presente na sua vida somente no momento de sua concepção, afora isto tudo mais que sabe sobre ele é ilusão. Muitas vezes choraram os filhos pela culpa do pai, mas este pranto é necessário porque sem ele só há cegueira, tropeços e perdição.

2 comentários:

  1. Sócrates, fui eu quem te fez aquela pergunta no último programa da MultiRio em que você participou. Falei da influência que seu livro teve na modificação da minha visão sobre o que compreendo de mim mesmo no sentido do que seja ser "masculino". Te fiz uma pergunta no ar citando seu excelente livro "O MITO DA MASCULINIDADE" e disse que tentei aplicar isso no meu casamento que não deu certo. Uma bobagem, claro. Estas idéias não são para aplicar mas para gerar uma reflexão, o que foi muito positivo para que eu pudesse compreender uma nova forma de olhar para o "masculino" na nossa sociedade, além de saciar certas dúvidas que me perseguiam quanto aos "porquÊs" de certas imposições de comportamentos masculinos. Penso que independente de gênero devemos acima de tudo estarmos abertos ao diálogo e ao questionamento dos modelos de comportamentos impostos e, claro, levando em consideração a história particular de cada um. Quanto ao relato anterior, suponho que eu esteja passando por uma situação um pouco similar ao que foi colocado. Me casei novamente e estou tendo a oportunidade de criar juntamente com minha nova esposa o filho dela do segundo casamento, de 8 anos de idade, o que tem sido uma experiência estimulante para mim no sentido de que eu, na mesma idade deste garoto, conviví muito com meu padrasto (não conhecí meu pai, ele faleceu quando eu tinha um mÊs de idade). Meu padrasto era muito frio, distante e ciumento e estou podendo colocar em prática na relação com meu "enteado" (detesto essa palavra) o inverso do tipo de relação que tive com meu padrasto. Tenho sido uma pessoa muito ligada ao garoto tanto no aspecto do incentivo, de se passar posturas éticas e morais (as quais acredito que tenham validade, claro) quanto no aspecto afetivo. Diferentemente da relação com meu padrasto, com "meu" garoto eu tenho uma relação de profunda liberdade de aproximação, de carinho, de abraço, de dizer "eu te amo" livremente sem pudores. Creio que iste esteja sendo muito bom para mim que posso exercitar sentimentalmente o oposto do que não tive com meu padrasto (agora no papel mesmo de padrasto) e ao mesmo tempo passar ao garoto o carinho, o afeto, o amor e a disciplina necessárias para que ele cresça com uma base emocional mais sólida. A vida nos coloca em determinadas situações as quais nos vemos de repente na situação inversa do que vivemos na infância, porém, como as experiências desta fase da vida são marcantes, podemos avaliar, pesar, ponderar e procurar agir de modo que as insatisfações que tivemos não ocorram novamente, agora que estamos no papel inverso. A experiência diária comparada constantemente ao passado é um grande acréscimo de experiência. Eu não tive a experiência de conviver com meu pai por uma fatalidade, conviví com meu padrasto que não me supriu afetivamente como pai e agora estou tendo a oportunidade de conviver com um garoto cujo pai está longe e pouco telefona para ele e estou agindo justamente no sentido oposto do que o meu padrasto agiu comigo. Eu me satisfaço porque ao pensar, agir e sentir dessa forma eu equilibro a balança do desconforto gerado pela falta de afetividade do meu padrasto e ao mesmo tempo reconheço na resposta positiva e afetiva da criança o que eu gostaria de ter sentido e não tive na relação com meu padrasto.

    Grande abraço, no aguarde do seu novo livro

    Fernando Cezar

    ResponderExcluir
  2. Caro Fernando,

    Desculpe nao ter podido responder seu comentario antes. Fico feliz em podermos continuar a conversa que começamos no programa.

    Seu padrasto perdeu uma possibilidade impar na vida de um homem: acompanhar o crescimento de um menino. Foi ele quem abdicou desta experiencia de crescimento e transformaçao, possivelmente ela teria feito dele um homem melhor. Mas isso nao é para todos.

    Muitos homens quando se tormam pai pela primeira vez, sao compelidos a fazer acertos na relaçao que tinham com seu pai. Nem sempre é uma experiencia facil, ainda mais que as reflexoes que emergem dai sao solitarias.

    Este menino tem sorte de ter te encontrado. Alguem que valoriza o vinculo entre duas pessoas e o compromisso que ambos passam a ter um com o outro. Os canadenses custuam dizer que quando o pai falta, o filho manca. A liberdade se adquire em uma experiencia sem pudores, sem temor de nos deparar com nos mesmos. Ser livre é poder fazer e assumir escolhas.

    Um grande abraço, voce pode estar certo de que esta fazendo a diferença.

    Podemos ser homens melhores, estou certo disso. Mas nao sem trabalho diario.

    O afeto é um combustivel usado para construir relacoes de parceria e cumplicida. Nosso destino enquanto pai é sermos superados pelos nossos filhos. Isso acontece se fizemos bem nosso trabalho.
    A
    Mutos

    ResponderExcluir