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sábado, 10 de outubro de 2009

ENTRE UM PROCESSO E OUTRO.

Ethan havia recebido uma notificação sobre um novo processo judicial. Sua ex-mulher sentia-se permanentemente lesada e lhe cobrava sucessivas indenizações. Agora era a vez dos seus primos fazerem o mesmo. Ethan ficou preocupadíssimo com estes fatos, temendo que o próximo processo fosse movido pelos pais de sua ex-mulher, seguido de um outro de seu atual marido. Nesta família, pensou ele, o negócio é ser indenizado.
Mesmo dizendo que está bem casada e com dois filhos, a sensação de ter sido roubada não tem fim. “Como você escolheu essa mulher para casar?”, perguntou-lhe uma amiga. Ethan respondeu que a conheceu de fato depois que se separou.
- Rapaz ela te cobra como alguém que nunca teve pai, comentou Teo. Ela é assim desde quando eu a conheci, só você não via. Aquele jeitinho manso e desprotegido, ela sempre usou como um disfarce para o ódio e a inveja que sente até hoje.
Parece que a inveja deixou a ex-mulher de Ethan estrábica. Ela se sente eternamente faminta.
Apesar de tentar mordê-lo com sucessivos processos judiciais, ela não consegue digerir absolutamente nada em sua vida. Sua alma emagrecida atesta que seu caráter sucumbiu. Ela carece de ódio para preencher o vazio que lhe devora, e para tanto, acredita que Ethan lhe roubou algo precioso. Com isto pode se sentir vitoriosa pelo menos uma vez na vida, mesmo que mergulhe na sujeira mais rala e etérea. Essa Pandora sem jarro, de caráter volúvel e inteligência cínica, sente-se feliz quando exala por onde passa o mal que carrega.
A despeito da destruição que causou, este tipo de atitude é expressão do seu esforço para escapar da mediocridade em que vive. A ex-mulher de Ethan é alguém que não se pode respeitar, pois ela não sente vergonha do que faz.
- E como se acaba com isto? Perguntou Teo.
- Com arte, respondeu Ethan.
- Você só pode estar brincando, retrucou Teo.
- Esta situação me deu a chance de poder transformar o que eu acreditava ser uma mulher no que foi minha ex-mulher.
- E o que ela foi pra você?
- Uma mentira que me permitiu conhecer a minha verdade.
- Você acha que ela nasceu assim? Perguntou Teo.
- Não, porque nenhuma mulher nasce mulher: torna-se, dizia uma escritora francesa.
- Rapaz, o que terá acontecido para que a sua se tornasse mesquinha e invejosa?
- Talvez a vida estranha que ela tenha levado, seus aspectos mais rudes e cruéis. Uma criança que vive uma história de abandono daquele porte sofrerá vertigens no que diz respeito ao juízo que formará de si mesma. Ela precisa esconder o que lhe aconteceu e acima de tudo, duvidar do que aconteceu. Só assim terá uma chance de sobreviver: mentir para si tantas vezes quantas forem necessárias para que isto se transforme em uma verdade.
Um amigo dizia que na casa de seu avô havia uma atmosfera cheia de opressão e depressão, bem como inimizade recíproca de todos contra todos. Nesta casa, o ódio envenenava os adultos e as próprias crianças. Creio que ela tenha vivido algo semelhante e para escapar disto, precisou acreditar em muitas mentiras sobre si mesma. Eu fiquei sendo aquele que a lembra disto e isto gera muito ódio. Ela não suportaria conter tanto ódio dentro de si. É uma situação miserável.
Com esta mulher Ethan descobriu que somente a miséria não é invejável.

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