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terça-feira, 10 de novembro de 2009

SABRINA E A PRANCHA.

Teo começou a sessão contando um sonho e um encontro que aconteceu dias atrás na sala de espera de um aeroporto.

Seu sonho revelava o quanto a separação havia afetado sua vida, exigindo-lhe uma competência que lhe faltava. O encontro no aeroporto retratava seu esforço para expurgar rapidamente o seu mal estar porque ele ainda acreditava em uma vida plena e só de bem estar.

Disse-me ele:

-Tive um sonho com meus amigos. Estávamos na praia sob um céu azul e um mar perfeito para surfar. Meu final de semana estava começando e eu sentia uma enorme sensação de liberdade. O que me excitava era a possibilidade de encontrar a mulher que sempre desejei e que me faria sentir especial.

Pego minha prancha e vou para o mar. Quando olho para traz percebo que a praia estava deserta. Olho para frente e sinto que estou sendo puxado para dentro do mar. O céu escureceu e uma onda gigantesca levantou-se, subi em minha prancha e surfei. Sentia medo diante daquela massa de água que poderia acabar comigo.
A voz de uma criança quebrou o pavor criado pela imensidão das águas, mas eu não conseguia vê-la. Ela pedia ajuda, com esforço percebi que era meu filho. Um desespero tomou conta de mim.

Fui acordado pelo despertador e quis falar com meu filho. O sonho me pareceu tão real. O sentimento de nunca mais vê-lo deixou-me atordoado.

Eu precisava chegar cedo ao aeroporto para pegar a ponte das oito. No caminho me sentia estranho, mergulhado nas emoções do sonho.

Estacionei e fui preparar meu embarque. O aeroporto estava sem teto e não havia previsão de liberação dos vôos. Resolvi fazer algumas ligações.

Imerso no que fazia me abstraí daquele lugar. Algum tempo depois fui até o balcão para saber se o embarque havia sido liberado e me deparei com aquela mulher. Não consegui olhar para mais nada. Naquele lugar só existia ela e eu, todos haviam desaparecido. A sensação de estranheza apagou-se e eu desejei que o aeroporto continuasse sem teto pelo resto do dia. Eu estava em céu de brigadeiro.

Ficamos lado a lado no guichê. Enquanto ela fazia algumas perguntas eu pude sentir seu perfume, admirar sua voz, mãos e os cabelos estendidos sobre a pele morena. Seu sorriso era estonteante. Até aquele momento ela não precisava de retoques. Eu havia encontrado a Sabrina de Humphrey Bogart.

Viajaríamos no mesmo avião. Comecei uma conversa como se estivesse falando com um outro homem, eu não queria que ela pensasse de inicio que era uma cantada. Procurei ser racional, controlando qualquer expressão de meu desejo sexual.
Durante nossa conversa ela se mostrou assertiva, determinada, independente, preparada, competitiva, me fascinava a cada minuto. Nós éramos extremamente parecidos.

Fiquei com medo de seduzi-la e levar um pescoção ou ser acusado de assédio. A libido não circulava entre nós, parecia que eu conversava com meus amigos. Novamente um sentimento de estranheza me assolou e ao olhá-la percebi que era como se eu estivesse conversando com um outro homem, ou melhor, com o sexo forte, quer dizer, com uma mulher disfarçada de homem.

Naquele momento Sabrina desapareceu.

Lembrei de meu último casamento e percebi que mais uma vez minhas fantasias me fizeram tomar um caldo da realidade. Aquela mulher jamais aceitaria surfar em minha prancha.

Teo evitava dialogar com a angustia gerada pelo final de seu casamento como se isto fosse sinal de fraqueza. Conquistar era o recurso que ele dispunha para anestesiar as eventuais dores do viver. Ele não percebia que o casamento duradouro é uma prática de intimidade que exige como condição, antes de tudo, intimidade consigo mesmo.

A descoberta dos segredos do amor duradouro faz com que nossas angustias se tornem marolas onde ninguém se afoga e as idealizações ficam restritas ao exercício da imaginação.

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